Este
ano meu blog ficou parado... pelo menos até agora. Queria muito retomar, mas
minha cabeça e atenção estavam voltadas para outros acontecimentos inusitados,
como o casamento da minha sobrinha em janeiro, seguido do desfile de carnaval e
a dengue em fevereiro/março, até finalmente a viagem à Irlanda, de abril a
junho.
Retornei
há pouco da Ilha Esmeralda, onde fiquei por dez semanas para fazer intercâmbio
em inglês, que foi a forma encontrada para viajar. Eu nunca tinha saído do Brasil
e, embora essa fosse uma viagem curta, foi uma aventura e tanto, repleta de
angústias, receios, saudades, superação, retomada de planos, aprendizagem e
companheirismo.
Meu
projeto tinha como base a literatura, fincada na leitura de Ulysses, de James
Joyce, um dos principais escritores irlandeses. A obra é dificílima e seria um
grande desafio para mim, mas estando próxima do cenário de Ulysses, talvez eu
conseguisse superar as dificuldades da leitura. Mas não só. Eu queria conhecer
outro país, a cidade de Dublin e, se possível ir a outros lugares na Europa.
A
realidade, porém, fez com que meus planos mudassem e náo consegui iniciar a
leitura de Ulysses imediatamente. Isso só aconteceu na quarta semana da minha
estadia, e foi melhor assim, porque poucos dias antes estive em Dún Laoghaire,
cidade a 20 minutos de trem do centro de Dublin, e local onde fica o Museu
James Joyce. Ele está instalado desde 1962 na Torre Martelo, em Sandycove, e
foi construído para a defesa contra a invasão francesa de Napoleão. Joyce se
hospedou no local quando tinha 22 anos, época em que começava sua carreira de
escritor.
A cena inicial de Ulysses se passa na parte superior da torre e o
episódio I também cita a Sala Circular. Todas essas informações e o
conhecimento “in loco” facilitaram o início da leitura para mim.
Embalada
por esse começo a leitura fluiu, o que não quer dizer que entendia tudo. A
estrutura do livro é bem complexa e diferente, e dá para imaginar o furor que
causou na época da publicação e que causa ainda hoje. Mas estar em Dublin e
conhecer de perto os lugares e endereços citados no livro, e poder acompanhar a
caminhada do personagem Leopoldo Bloom pelas ruas da cidade naquele 16 de junho
de 1904, tem um significado maior.
Sem falar nas referências a Joyce, que estão
por todos os cantos de Dublin, desde sua bela estátua na North Earl Street, bem
no centro da cidade, passando por outras em pubs como The Temple Bar e The
Oliver St. John Gogarty Bar & Restaurant, e o Museu de Cera, até a ponte sobre
o rio Liffey, que leva o seu nome e que fica perto da casa onde se passa o
conto “Os mortos”, em Dublinenses, além dos locais que fazem referência à sua vida
e obra, como o James Joyce Centre e o Museu dos Escritores.
Mas é
em Ulysses que as referências a Joyce se concentram mais e no percurso de
Leopoldo Bloom pelas ruas da cidade. E estar em Dublin no dia 16 de junho, participando
do Bloomsday, foi algo mágico, e planejado.
Fiz a caminhada por pontos-chave na
vida e obra do escritor, estive no cemitério Glasnevin, local em que se passa a
cena do enterro de Dignam, colega de Leopoldo Bloom, passei pelo pub Davy Byrnes,
onde alegre comemoração lotava as dependências e a frente do bar, parei ainda
em algumas livrarias, como a Hodges Figgis, que homenageia Joyce, e terminei o
dia em uma apresentação de textos e leituras da obra do escritor.
Durante
minha permanência em Dublin procurei ainda conhecer muitas das ruas citadas em
Ulysses e fiz alguns trajetos, desde a Eccles Street, onde o personagem mora,
passando pela bela igreja de São Jorge (hoje infelizmente fechada) até chegar ao
centro da cidade, onde placas nas calçadas de algumas ruas marcam a passagem de
Bloom.
Estive na igreja de Saint Andrews e na Sweny, antiga farmácia, citada na
obra e onde o personagem compra um sabonete. O local hoje é uma espécie de
sebo, no qual irlandeses e turistas se reúnem semanalmente para ler os livros
de Joyce. Tive a oportunidade de participar de uma dessas leituras, inclusive
lendo um trecho de Ulysses, em inglês.
Aproveitei
também para conhecer o vilarejo de Howth, lugar em que Leopoldo Bloom pede a
mão de Molly Mallone em casamento. Molly, aliás, é lembrada com uma estátua na
esquina da Grafton Street com a Suffolk Street. E ainda visitei Galway, cidade
onde Joyce conheceu sua esposa, Nora Barnacle. A paisagem pelo caminho até
chegar à cidade é deslumbrante.
Mas
nem só de Joyce a Irlanda vive. Há outros escritores irlandeses reverenciados
no país. Em Dublin há uma despojada estátua de Oscar Wilde no Páirc Chearnóg
Mhuirfean, na Merrion Square. Ali em frente encontra-se a casa onde o escritor
viveu, hoje uma escola. Samuel Beckett, dramaturgo e poeta, tem uma bela ponte sobre
o rio Liffey que leva seu nome. E Bernard Shaw é lembrado com uma placa na casa
onde nasceu, além de um pub com seu nome. Já Bram Stoker, autor de Drácula, tem
um museu castelo em Clontarf, subúrbio de Dublin, e nos jardins da Saint
Patrick”s Church há placas homenageando os escritores, sem esquecer do Museu
dos Escritores, que exibe documentos e obras, e o Museu de Cera, que contém uma
sala só com réplicas dos escritores irlandeses.
Mas é
claro que a minha investida foi mais em James Joyce, um escritor que sempre me
intrigou e fez com que eu atravessasse o oceano para ir a uma terra estranha e,
assim, tentar entender seu livro Ulysses. A propósito, não consegui terminar a obra,
mas já avancei bem na leitura.
Se
valeu a pena? Sim, valeu.
No entanto, tudo o que eu escrevi aqui não é suficiente para expressar o que senti e vivi em Dublin nesses pouco mais de dois meses. É indescritível.
No entanto, tudo o que eu escrevi aqui não é suficiente para expressar o que senti e vivi em Dublin nesses pouco mais de dois meses. É indescritível.