quinta-feira, 26 de junho de 2014

Personagens na Copa

No clima da Copa do Mundo no Brasil, o universo literário vem batendo um bolão entre os apaixonados por literatura, mas não só com os lançamentos de livros voltados ao esporte, mas também com souvenirs, entretenimentos e iniciativas interessantes e criativas. Entre elas, o projeto Figurinhas na Copa, do estúdio Ilustranet, que consistiu na criação de figurinhas virtuais com personagens representativas da cultura pop.

A equipe de ilustradores do estúdio escolheu, para a homenagem artística, 14 países que participam do Mundial, e fizeram uma interpretação livre de figuras de sucesso na TV, quadrinhos, cinema e livros de cada nação. O Brasil também marca presença com uma personagem, escolhida em uma votação na página do Ilustranet.


Dos 1.458 votos, a campeã foi uma menina baixinha e dentuça: Mônica, personagem de quadrinhos, criada em 1963 por Maurício de Souza. Ela venceu adversários de peso, como O Menino Maluquinho (Ziraldo), Mussum (Trapalhões), Blanka (Street Fighter), Zé Carioca (Disney), Saci Pererê (Folclore) e Emília (Monteiro Lobato), entre outros.

Além do Brasil foram homenageados os seguintes países com seus respectivos personagens:

Inglaterra – Dr. Who
Alemanha – Fix Und Foxi (raposinhas)
Estados Unidos – Mickey Mouse
Rússia – Cheburashka
Bélgica – Tin Tin
Japão – Godzilla
Itália – Topo Giggio
Espanha – Pocoyo
Coréia – Pucca
México – Chaves
França – Asterix
Holanda – Miffy
Austrália – Taz
Argentina – Mafalda

Saiba mais sobre esses personagens na página do Ilustranet .

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Copa do Mundo de Literatura

Se com a bola se faz uma Copa do Mundo de Futebol, é com livros que se faz uma Copa do Mundo de Literatura. E esta está rolando desde o dia 12 de junho, já na fase do mata-mata, com a partida disputada por Brasil e Camarões. De um lado Budapeste, de Chico Buarque; de outro Dark Heart of the Night, de Leonora Miano, com vitória, para nosso deleite, de Budapeste, pelo placar de 4 x 0.

A ideia surgiu do projeto do professor Chad W. Post, da Universidade de Rochester, nos Estados Unidos. Ao todo, são 32 países participantes, representados por um livro sugeridos por e-mail, Facebook e Twitter e que foram publicados a partir do ano 2000.



Para cada partida, um juiz (ao todo são 15 resenhistas, selecionados entre acadêmicos, editores, livreiros e leitores) analisa os dois livros, estabelecendo comparações entre eles e justificando a decisão com uma crítica literária. Nem todos os livros estão disponíveis em português, sendo que, além da partida entre Brasil e Camarões, aconteceram mais seis, com os seguintes resultados:

Day of the Oprichnik, de Vladimir Sorokinn (Rússia) 1 x 2 The Sexual Life of an Islamist in Paris, de Leila Marouane (Argélia).  

The Days of Abandonment, de Elena Ferrante (Itália) 5 x 3 NW, de Zadie Smith (Inglaterra)

Seu Rosto Amanhã, de Javier Marias (Espanha) 3 x 4 Barley Patch, de Gerald Murnane (Austrália).

Memórias de Minhas Putas Tristes, de Gabriel Garcia Marquez (Colômbia) 0 x 1 1Q84, de Haruki Murakami (Japão)

My Mother’s Lover, de Urs Widmer (Suíça) 0 x 3 Insensatez, de Horacio Castellanos Moya (Honduras) 

Um Acontecimento na Vida do Pintor Viajante, de César Aira (Argentina) 1  x 0 Graceland, de Chris Abani (Nigéria)

As demais partidas são:

• 20/06 – México x Croácia
Rostos na Multidão, de Valeria Luiselli x Baba Yaga Laid an Egg, de Dubravka Ugrešić

• 20/06 – Portugal x Estados Unidos
Jerusalém, de Gonçalo M. Tavares x The Pale King, de David Foster Wallace

• 23/06 – França x Equador
O Mapa e o Território, de Michel Houellebecq x The Potbellied Virgin, de Alicia Yánez Cossío

• 24/06 – Chile x Holanda
Noturno do Chile, de Roberto Bolaño x O Jantar, de Herman Koch

• 25/06 – Grécia x Costa do Marfim
Why I Killed My Best Friend, de Amanda Michalopoulou x Alá e as Crianças Soldados, de Ahmadou Kourouma

• 26/06 – Bósnia x Irã
Como o Soldado Conserta o Gramofone, de Saša Stanišić x The Colonel, de Mahmoud Dowlatabadi

• 26/06 – Bélgica x Coréia do Sul
The Misfortunate, de Dimitri Verhulst x Your Republic Is Calling You, de Young-ha Kim

• 27/06 – Uruguai x Costa Rica
The Rest Is Jungle, de Mario Benedetti x The Cadence of the Moon, de Oscar Núñez Oliva

• 27/06 – Alemanha x Gana
Austerlitz, de WG Sebald x Search Sweet Country, de Kojo Laing

Todas as partidas são eliminatórias e o campeão será anunciado após análise dos juízes Os jogos podem ser acompanhados no site do Three Percent ou na página da World Cup of Literature no Facebook.

O Brasil também promove um campeonato semelhante desde 2007. O ano passado, o vencedor foi Diário da queda, de Michel Laub, depois de confrontar O sonâmbulo amador, de José Luiz Passos. Dois “livraços”, por sinal.

terça-feira, 17 de junho de 2014

Minha seleção literária

Em ritmo de Copa do Mundo, 16 dos países que estão participando do Mundial 2014, no Brasil, ganharam seleções escaladas pela editora britânica Penguin  - http://www.penguin.co.uk/authors/penguin-cup/

A seleção literária de "craques" brasileiros ficou montada conforme o campo abaixo:




Muitos dos nomes eu concordo, outros nem tanto... e ainda incluiria mais alguns.


Então resolvi montar minha seleção literária brasileira.


Ela seria composta por autores clássicos e contemporâneos. Eis os meus "craques" (só não defini as posições), mas...



Machado de Assis

Graciliano Ramos

José Lins do Rego

Carlos Drummond de Andrade

João Guimarães Rosa

Cecilia Meireles

Mario de Andrade

Lygia Fagundes Telles

Cristovão Tezza

João Ubaldo Ribeiro

Eliane Brum


Fique à vontade para concordar ou não. E escale também a sua seleção literária do Brasil.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Literatura e futebol

Desde criança o futebol sempre ocupou um lugar especial na minha vida. Filha de um palmeirense, palmeirense me fiz, com muito orgulho. Assim, as melhores lembranças que guardo da infância são aquelas ao lado do meu pai nos campos de futebol, acompanhando partidas, ou em frente à TV, torcendo para o nosso time, ou pela seleção brasileira.

No entanto, nos últimos anos sinto que minha paixão pelo futebol tem diminuído, e muito. Quase não acompanho mais, tanto o Palmeiras quanto a Seleção do Brasil, acho que as maracutaias, mas, sobretudo, as torcidas organizadas têm a ver com essa minha indiferença. O que me entristece, ainda mais porque a Copa do Mundo está aí, no nosso país, e eu ainda não me animei.
 
Mas, apesar de tudo, é difícil não se deixar envolver e, com certeza, não sou de torcer contra. Para dar um up e tentar me aquecer fui buscar auxílio na literatura, me aventurando pelas páginas de Entre as quatro linhas – contos sobre futebol, antologia organizada por Luiz Ruffato, lançada neste ano pela Editora DSOP.

O livro reúne 15 nomes da literatura brasileira contemporânea, sendo nove homens e seis mulheres: Mario Araújo, Fernando Bonassi, Ronaldo Correia de Brito, Eliane Brum, Flávio Carneiro, Andre de Leones, Tatiana Salem Levy, Adriana Lisboa, Ana Paula Maia, Tércia Montenegro, Marcelo Moutinho, Rogério Pereira, Carola Saavedra, André Sant´Anna e Cristovão Tezza.

O autor mais velho tem 62 anos e o mais jovem 33. Destes, cinco nasceram no Sudeste, quatro no Sul, dois no Nordeste, dois no Centro-Oeste e dois no exterior. Quanto ao local de residência, cinco vivem no Rio de Janeiro, quatro em São Paulo, dois em Curitiba e cada um dos outros em Recife, Fortaleza, Brasília e Estados Unidos.

Com relação ao time do coração, quatro torcem para o Botafogo, dois para o Fluminense e Atlético Paranaense. Flamengo, Coritiba, Vasco, Palmeiras, Grêmio, Goiás e Fortaleza completam a lista, com um torcedor cada.

Na introdução da coletânea, Ruffato lembra que apesar de o Brasil ostentar cinco títulos mundiais no futebol, conquistados em 1958, 1962, 1970, 1994 e 2002, e do esporte ser uma paixão nacional, “os escritores brasileiros sempre guardaram distância do tema, rejeitando-o, já nem digo como motivo principal, mas até mesmo como referência secundária”.

Agente alienador, pertencente a um universo pouco frequentado pela ficção, talvez seriam os motivos pelos quais essa ausência se faça sentida”. Mas alguns nomes da literatura, como Mario Filho, João Saldanha, Roberto Drummond e, principalmente, Nelson Rodrigues, fizeram do esporte matérias essenciais de suas crônicas, contagiando romancistas e contistas.

Entre as quatro linhas busca expressar isso, procurando mostrar a paixão pelo futebol no Brasil. Alguns contos, como acontece em toda antologia, sempre se sobressaem a outros, cumprindo melhor o seu papel. Dentre estes destaco A história do futebol, assinado por André Sant´Anna, que utiliza a fantasia da criança e do adolescente se fazendo passar por um craque para contar a sua história do futebol, com destaque para o Fluminense, seu time do coração. E começa assim:

Quando o futebol foi inventado, em 1969, o George Harrison era de Belo Horizonte e, no prédio dele, na escola dele, na rua dele, as pessoas ou eram Atlético ou eram Cruzeiro. O primo do George era Atlético. O George era o Tostão, do Cruzeiro.
O pai do Tostão e a família do pai do Tostão eram do Rio e tinham uma ligação muito forte com o Fluminense.

O conto é bastante criativo – e difícil. Por vezes me senti perdida entre aqueles nomes de jogadores que eram e não eram eles, que na verdade eram o narrador, seu primo, seus amigos, e também eram os jogadores de verdade. Mas depois foi show de bola, e uma verdadeira declaração de amor ao esporte.

E futebol é uma das coisas mais importantes na minha vida, desde o Tostão, em 1969, e o Fluminense, nos últimos anos, têm sido um Fluminense que nem aquele da Máquina e aquele que foi tricampeão carioca em 1983 / 1984 / 1985 e campeão brasileiro de 1984 – 1 x 0 e 0 x 0 – contra o Vasco, gol de Romerito, e o Fluminense foi campeão carioca em 2005 e 2012 e foi campeão da Copa do Brasil, em 2007, e campeão brasileiro em 2010 e 2012 e ainda teve 2009, quando o Fluminense ia cair para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro e não caiu e foi tão sensacional quanto ganhar um título.

Outro conto bacana é o da Tatiana Salem Levy, Um dia, uma camisa, em que ela conta a história de um casal que vive em Lençóis, no Maranhão. Os dois sonham em ir para o Rio de Janeiro, ela para ser atriz; ele para jogar no Flamengo. Os sonhos são interrompidos quando um estrangeiro aparece no local e promete ao rapaz que enviará camisas do Barcelona para o time local quando retornar à Espanha. Com a promessa, ele não quer mais sair de Lençóis, e sua mulher acaba indo embora com o filho pequeno, esperando que em breve o marido vá também. Triste e belo ao mesmo tempo.

Raimundo, o dono da bola, de Eliane Brum, é um conto diferente: denso, forte, dolorido, emocionante, aliás como são todos os textos da escritora. Ele se passa dentro da floresta, em um recanto bem longe, talvez na Amazônia, onde os modismos e o consumo não chegam. Uma outra realidade. Ali, Raimundo, o protagonista, sonha. Sonha em alcançar o mundo, mas seu pai o faz prometer fincar os pés na terra e continuar a lida da luta diária da preservação.

O pai amainou. Agora eu posso te dar o mundo. Porque sei que tu vai ficar aqui. E Raimundo menino sentiu a cabeça voar, como se dela pudessem sair asas que atravessavam rios porque o pai lhe daria o mundo, mas ao mesmo tempo viu seus pés se espicharem, os dedões alongando-se em raízes de carne que para sempre estariam fincadas no ventre do castanhal.  E desde então cresceu partido, parte dele pássaro, parte árvore.

Quando Raimundo, já adulto, entra em contato com o mundo, por meio de um rádio portátil que um conhecido lhe oferece, e ali escuta uma partida de futebol, a paixão pelo esporte lhe é despertada. Ele fantasia inocentemente e se deixa manipular pelos homens da cidade. Com isso, acaba esquecendo a promessa feita ao pai. Talvez Eliane saia um pouco do foco futebol, mas a história é tão intensa que o resultado é fascinante.

Vale destacar ainda os contos Meu pequeno amigo cubano, de Flávio Carneiro; Domingo no Maracanã, de Marcelo Moutinho, e Uma questão moral, de Cristovão Tezza. Envolventes. Sem falar que as histórias mexeram com minha memória futebolística e reacenderam lembranças queridas. Acho que estou começando a me animar.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Agonia e êxtase

Nunca tinha lido nada de William Faulkner, o premiado escritor norte-americano, agraciado em 1949 com o Nobel de Literatura, em 1951 e 1955 com o National Book Awards, e em 1955 e 1962 com o Pulitzer. Por isso, nem sabia por onde começar. Já tinham me falado que seus livros eram muito densos e difíceis de ler, o que me deixava com um pé atrás, mas acabei me deparando com Enquanto agonizo, obra publicada em 1930, indicada em um dos Clubes de Leitura dos quais participo.

Faulkner alegou ter escrito o romance em seis semanas, enquanto trabalhava, em uma usina elétrica, levando carvão para a caldeira. Durante a noite, não tinha muito trabalho, então aproveitou para escrever. Uma façanha e tanto, já que o livro é considerado uma de suas principais obras, na qual utiliza da técnica da narrativa de fluxo de consciência, com vários narradores. Cada um abre um capítulo, alguns mais longos e outros mais curtos.

Confesso que narrativas com fluxo de consciência me cansam. Fico perdida entre os pensamentos dos personagens e acabo confusa, o que fatalmente me obriga a retomar os trechos lidos. Com Faulkner não foi diferente, embora os capítulos, não muito extensos, facilitassem a leitura, mesmo com a diversidade de vozes narrativas.

Da estranheza e dificuldades iniciais surgiu uma empatia grande que, por fim, se transformou em um fascínio, uma entrega ao livro, à história. Rendi-me a Faulkner e terminei o livro completamente encantada.

São 59 capítulos nos quais se alternam as vozes de 15 personagens diferentes. A história gira em torno da morte da matriarca de uma família pobre do sul dos Estados Unidos: Addie Bundren, casada com Anse Bundren, com o qual tem cinco filhos: Cash, Darl, Jewel, Dewey Dell (a única mulher) e Vardaman (este um menino ainda).

Moribunda, a mãe assiste da janela a confecção de seu caixão por Cash, o filho mais velho que é carpinteiro e tem um problema na perna em razão de um acidente. A cena é, no mínimo, surreal, como neste trecho narrado por Darl:

É por isso que ele está lá fora embaixo da janela, martelando e serrando aquele maldito caixão. Onde ela pode vê-lo. Onde todo ar que ela aspira está impregnado das marteladas e serradas onde ela pode vê-lo dizendo Veja. Veja que beleza estou fazendo para a senhora.

Com a morte de Addie, seguida de seu funeral, começa o martírio da família para enterrá-la, pois era seu desejo ser sepultada na cidade de Jefferson, distante do lugarejo onde moram. Nessa empreitada vamos conhecendo os personagens e, principalmente, o marido e os filhos de Addie, cada qual com seus problemas, como se vivessem em um mundo à parte: da gravidez de Dewey Dell (que vai em busca do aborto, pois a família não sabe de seu estado), passando pelas loucuras de Darl (o personagem com mais voz) até Vardaman, que associa a mãe a um peixe, as histórias vão se encaixando.

Mas a viagem não é fácil, dificultada ainda mais pelas recentes chuvas que caíram na região e acabaram inundando as pontes principais sobre o rio. Na travessia, o caixão é jogado para fora da carroça em que era transportado, mas Jewel, um dos filhos, consegue resgatá-lo. Assim, a viagem prossegue por mais de uma semana, uma peregrinação em que o leitor acaba se enredando, como se fizesse parte daquela caravana absurda, que já começa a trazer no bojo o cheiro da morte.

Uma das passagens mais interessantes é quando a morta, Addie Bundren, tem sua vez na narrativa. Faulkner também dá voz à mulher, que conta sua versão dos fatos, esclarecendo e enriquecendo partes da história. Aos poucos tudo vai ficando mais claro e o leitor se vê tomado pelo livro.

O desfecho da história é surpreendente, mas não deixa de ser engraçado. E ao chegar ao fim, temos a certeza de que valeu a pena a persistência, esquecer as estranhezas iniciais, avançar um pouco mais na leitura e se deleitar com a escrita de Faulkner.